28.5.10

Ocasionalidades.

O despertador ruge como um leão faminto. Com a preguiça do mundo sobre os ombros, rastejo para fora da cama enquanto tento coordenar o movimento irregular das pernas e braços. Arrumado para o trabalho, entro no carro, abro o portão e me coloco nas ruas.
Em alta velocidade, uma mulher "aproveita" o sinal que estava vermelho e avança cortando minha frente. A mesma faz uma curva e coloca o carro em frente ao meu.
Estupefato, acelero e ocupo imediatamente a vaga ao lado.

Mentalmente, projeto em menos de 1 segundo, duas cenas: a primeira onde despejo desaforos à mulher, em repúdio ao seu ato irresponsável que poderia ter colocado-me em risco. Na segunda, relevaria e tomaria maior atenção ao meu modo de dirigir, uma vez que reagir a situações de trânsito com violência só gera violência e não mudança. Optei pela segunda e me acalmei.

Aquele fato não gerou mais do que um comentário com o colega da mesa ao lado e acabei por esquecer dele.

Meses depois, ao sair de uma festa, entro em meu carro pensando somente em parar no cachorro-quente mais próximo, uma vez que os dinossauros bradavam em meu estômago. Resolvo fazer um caminho que comumente não faço e avisto um carro à distância. À sua frente, um poste que foi beijado pela dianteira do veículo. Um arrepio correu-me pela espinha.

Emparelho meu carro. O rosto desesperado da motorista, que ostentava olhos inchados por copiosas lágrimas se viram para mim: era a mesma mulher do incidente anterior de trânsito.

Ocasionalidades? São frutos de nossas decisões e por menores que pareçam, todas elas somadas geram grandes decisões. Em determinados momentos parecem peças isoladas e desconexas mas fazem parte de um grande quebra-cabeça, irregular e complexo demais para ser entendido naquele momento. Quando conseguimos avistar sua obra e sua beleza, damos a ele o nome de vida.

Saí do carro, aguardei até que o guincho chegasse para rebocar o que restou do carro dela. Ofereci uma carona até sua casa. Ela aceitou com um meneio de cabeça. Não esboçou reação até chegar em sua casa.

Ao sair do carro, perguntei pela última vez se estava tudo bem com ela. Ela acenou com a cabeça e disse apenas: "Ao invés de agradecer por hoje, lhe pedirei desculpas pela imprudência do outro dia."

E o mundo segue girando.

Um comentário:

Tayana disse...

olhaaaaaaaaaaaa só como o mundo dá voltas! adorei..